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Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

"E Marine Le Pen chegou ao segundo turno"

Depois de muitos anos tentando, a extrema-direita chegou ao que buscava na democrática república da França. Não ganhou a eleição, com a Frente Nacional, como também já tinha acontecido antes com Jean-Marie Le Pen, mas o feito de sua filha, Marine, traz contornos de vitória àquilo que muitos veem como derrota eleitoral. Afinal, mesmo perdendo, o objetivo de colocar em destaque um determinado modo de pensar a política e a vida em sociedade já faz de Marine Le Pen uma vitoriosa.

O feito de Le Pen tem grande peso, uma vez que ela conseguiu se aproveitar de uma crise econômica e social - devido às desigualdades sociais, instaladas há tempos na França - e do processo de imigração em massa - causado atualmente pelo imenso contingente de refugiados que chegam à Europa - para chegar, enfim, àquilo que o pai tentava, mas sempre sem grande sucesso. Isso porque agora, tempo de grande crise, um imenso contingente de franceses decidiu que a visão determinista de Marine Le Pen, de fato, pode explicar a razão de a França não ser mais tão grande.

A Antropologia Moderna refutou peremptoriamente o que aqui estou chamando de visão determinista, já que, através das contribuições do Culturalismo e do Funcionalismo, por exemplo, mostrou que só com um sério trabalho de campo, e com observação participante de um povo, se pode chegar ao conhecimento da função de cada gesto, cada rito, cada mito, cada dança, enfim, de cada aspecto do conjunto cultural de uma sociedade. As contribuições dessas escolas teóricas fizeram com que o Evolucionismo Cultural, que, na prática, determina o caráter de uma pessoa ou grupo social pelo lugar de nascimento ou moradia, ou pela sua ascendência, caia por terra, uma vez que uma análise realmente isenta e científica de uma sociedade refutará, de pronto, qualquer resquício de determinismo geográfico ou biológico.

Acontece, todavia, que o etnocentrismo nosso de cada dia não nos permite entender que não há hierarquização das culturas, já que insistimos em ver o outro como inferior, dado que ele não pensa como nós pensamos. Assim, o discurso de "uma França branca e para os franceses" acaba por insistir na máxima que entende que africanos e muçulmanos - só para ficar nesses dois exemplos - não podem fazer parte de um país tão grande e tão admirado por suas particularidades culturais.

Por isso, pode até ser que Le Pen nunca chegue à presidência da França, o contrário do que Trump conseguiu nos Estados Unidos, e do que Bolsonaro tenta no Brasil, mas é inegável a vitória daquela figura em colocar em destaque uma visão que, por mais que no cotidiano exista com força, está sempre sendo disfarçada, jogada para debaixo do tapete, sendo que inegavelmente vai continuar a pautar as discussões políticas no Brasil, na França e alhures. Só que tal visão, por mais que a crise consiga sustentar, é demasiadamente perigosa, já que determina quem é e quem não é; quem pode e quem não pode. O problema é que, exceto nos casos em que o dinheiro "branqueia", vai ser muito difícil definir a "raça pura" em uma nação de pardos. Aqui não tem jeito; somos miscigenados mesmo. O "complexo de vira-latas" nunca nos coube tão bem. E, nesse caso, ser "complexado" é algo muito, muito bom.

liberdade, beleza e Graça... 


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