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Graduado em Artes Cênicas, Teologia e Ciências Sociais. Mestre em Sociologia e Direito pela UFF, Doutor em Sociologia pela UERJ e Pós-doutor em Sociologia Política pela UENF. Pesquisador de Relações Raciais, Sociologia da Religião e Teoria Sociológica. Professor do Instituto Federal de São Paulo.

domingo, 23 de maio de 2010

"El secreto de sus ojos"

Sempre após a festa do Oscar é possível se ter uma noção de qual é o melhor filme do ano. Em geral, a película que ganha o prêmio de melhor filme estrangeiro é o melhor trabalho do ano, pois os estadunidenses não dão esse título a uma película que não seja produzida por seus patrícios. Para eles, o melhor filme terá sempre de ser o que das ideias deles saiu e ponto final.
Mas os bons cinéfilos sabem o que fazer assim que a festa termina; torcer para que o melhor filme estrangeiro chegue logo por essas terras, pois trata-se quase sempre do melhor trabalho cinematográfico do ano, sendo bem poucos os anos em que essa tese não se confirma.
Esse ano não foi diferente; o argentino "O segredo dos seus olhos" é disparado o melhor trabalho de cinema feito no ano passado. Com todas as honras, a película de Juan José Campanella é o melhor filme do ano e, nos dizeres de um cinéfilo de marca maior, é IMPAGÁVEL.
Desde "Clube da lua" que o ator Ricardo Darín entrou para o panteão daqueles intérpretes inesquecíveis. No 'quase romance' que vive com a personagem interpretada por Soledad Villamil, o Benjamín Espósito de Darín é mais um daqueles papeis que valem o ingresso e o incontido choro no final.
Guillermo Francella é outro que faz do filme algo de uma preciosidade de fazer calar. A música é perfeita, como sempre no cinema argentino, e a turbulenta e extremamente romântica Buenos Aires dos anos 1970 é trazida com uma minuciosidade, uma potência, uma poesia de fazer embasbacar.
A trama conta a história da tentativa do investigador de polícia Benjamín Espósito de escrever uma novela, sendo que nada nela será inventado, já que a pretenção é narrar algo de que ele mesmo foi protagonista anos antes. Tratar-se-á de uma história de amor, vivida em meio à investigação de um estupro seguido de assassinato, em que Espósito trabalhou, tendo o grande amigo, interpretado por Francella, como parceiro leal e amoroso, algo demonstrado sempre e até o fim de uma vida.
Espósito não consegue contar a própria história, pois ela é dividida com uma bela mulher casada, por quem ele sempre nutriu a razão de ser da novela que teima em não sair. O romance só será possível de ser concluído se o tal objeto de desejo vier a participar de maneira a fazê-lo, Espósito, compreender suas escolhas, ações, decisões e equívocos do passado. A busca não é, pois, por narrar, mas por compreender o passado e as escolhas feitas nele, a fim de que um amor que tinha tudo para acontecer explique a razão de nunca ter sido.
Só a partir do momento em que Benjamín Espósito decidir enfrentar a si mesmo, conseguirá atingir aquilo que deveria ter sido atingido 25 anos antes em sua história: encarar a mulher que ama, tendo a coragem de dizer a ela esse segredo guardado por 25 anos na fala, mas falado a cada novo dia na tradução, teimosamente não lida, do segredo dos seus olhos.
Correndo de forma paralela, a saga vivida pelas personagens de Pablo Rago e Javier Godino, viúvo e assassino, respectivamente, de uma mulher belíssima, ganham ares de tentativa de se explicar a verdadeira essência humana; a paixão que nos move a matar e a morrer, mostrando o pior e o melhor que cada um pode fazer, numa luta apaixonada de todos contra todos.
É por paixão que o assassino estupra e mata e é por paixão que o viúvo guarda uma vingança que nem o mais atento cinéfilo poderia imaginar, exceto se atentar desde o início da trama para o "método do paradigma indiciário", utilizado pela personagem de Francella.
Tal como o cego Tirésias, do clássico "Édipo Rei", o alcoólatra que Guillermo Francella vive consegue interpretar cada indício e sempre enxergar respostas, exatamente aonde os olhos pensam esconder segredos. Nada parece escapar à visão de alguém que é deixado à margem daquilo que o mundo sempre anunciará como "normal".
O final é um soco no estômago. Por isso, esqueça todo o resto e, por você mesmo, vá ao cinema!

liberdade, beleza e Graça...